quinta-feira, 27 de janeiro de 2022

Em 2022 e em 2005, Virgilio de Souza entrevista Heloisa Pires Ferreira em seu jornal Capital Cultural. Em 2011 Heloisa escreve sobre Bondes, Ônibus e Pessoas, no Jornal Capital Cultural. Em 2012 Individual no Canto da Carambola e Em 2003 Sol Negro, capa do Livro de Marilena Chauí.

Honduras - 2013 - Gravura em metal: buril, ponta seca e água tinta - 0,30 x 0,30cm


     Foto: Vírgilio de Souza

“O Rio se transformou em um amontoado de coisas” 

“Adoro o Rio, mas exploração imobiliária, a falta de planejamento urbano a ganância transformaram a cidade de forma desastrosa”  - Heloisa Pires Ferreira

 Clique aqui e leia a entrevista completa.

  Obra "O Sol Negro" de 1978, em gravura em metal: água tinta que inspirou a capa do livro da filosofa Marilene Chaui, em 2003, "Convite a Filosofia",  editora Ética, página 110, ao falar de Silogismo, o texto é ilustrado novamente com a gravura e a legenda:  

"Sol negro, de 1978, gravura de Heloisa Pires Ferreira que serve como exemplo visual do Silogismo: o quadrado externo seria a premissa maior, e o círculo negro, a premissa menor. no centro, a conclusão."   Marilena Chauí

Canto da Carambola Individual Ciclos 2012

 

 

 

 

 

 Canto da Carambola - Individual "CICLOS" de Heloisa, em 2012 

“Vista no conjunto, a obra de Heloisa marca uma unidade que não é produto de simultaneidade de criações mas de recorrências do imaginário da artista, como estrutura, inserido em transformações e metamorfoses, que se recuperam umas às outras”.       Mário Barata em apresentação, também, da exposição individual de Heloisa Pires Ferreira no Museu Nacional de Belas Artes,  em 1995 – Mario Barata é Membro do Conselho diretor da Association Internationale des Critiques d’Art, Paris.

Clique aqui e leia a matéria completa


Heloisa recebe os visitantes da exposição na rua Oriente em Santa Teresa no casarão Canto da Carambola.

 

Material sobre Heloisa em exposição
 

 

 

 

Heloisa com 2 cópias de Sol Vermelho - 2004 - 0,10 x 0,10cm

 

 

 

Espaço Devastado - Gravura em metal: buril e água tinta - 1988 - 0,30x0,42 cm 

                                    Foto: Henry Stahl
 

 

 

 

 "QUEREMOS OS BONDES ANTIGOS DE VOLTA COM OS TAIOBAS, REBOQUES E BAGAGEIROS."                                                                                                                                  Heloisa Pires Ferreira 

                                                       em novembro de 2011, nº141, no  

                                    Jornal Capital Cultural  

  e escreve sobre:

SOBRE BONDES, ÔNIBUS E PESSOAS.

Santa Teresa, no início dos anos 60 possuía bondes que saíam da Estação da Carioca de 4 em 4 minutos e circulando pelo bairro iam ao Silvestre e a Paula Matos e era o único meio de transporte e que satisfazia a todos os morados.  Éramos conhecidos dos Motorneiros e Condutores que muitas vezes paravam os bondes em nossas portas quando tínhamos crianças ou sacolas nos braços.  Eram atenciosos com todos e nos conhecíamos pelos nomes e sabiam onde morávamos.

Começou o desmoronamento desse sistema de transporte quando as companhias de ônibus ambiciosas em ocupar os territórios do bairro entraram em acordo com os fiscais dos bondes e com muita pressão eram ouvidos e diminuíam os bondes em circulação, deixando moradores desesperados pela falta de transporte.  Assim, mansamente, sob o desespero de moradores, que mal podiam falar em plena ditadura militar, tiveram que engolir esses ônibus sem personalidade, sem motoristas ou trocadores enraizados que criassem vínculos e passassem a ser conhecidos por todos.

Assim, temos engolido esse asqueroso meio de transporte que não respeita crianças, alunos, gestantes, idosos e nem moradores.  Voam bairro abaixo ou acima assustando transeuntes ou passageiros.  Não ouvem.  São surdos aos apelos.  Os donos das companhias que servem nesse bairro ao longo desses anos são surdos aos reclames dos donos dos casarios centenários que se machucam com o choque de seus pesos e pneus sobre as ruas. São surdos a qualquer tipo de diálogo.  Até aparecem algumas vezes, mas nada mudam.  Só pioram com o desrespeito às normas de bom convívio.

Não é o meio de transporte que o bairro precisa.  Queremos os bondes inteiros de volta e conduções de ônibus, vans ou outros meios pelas ruas laterais do bairro, onde não passam os bondes. Ligando aos bairros próximos como Laranjeiras, Cosme Velho, Rio Comprido, Bairro de Fátima, Catumbi e Glória, deixando praticamente as ruas Almirante Alexandrino, Joaquim Murtinho e Muratori livres para que os bondes possam circular tranquilamente e livre dos danos aos imóveis tão queridos por todos nós.

Para a integridade de Santa Teresa em todos os níveis precisamos dos bondes tradicionais, tombados e inteiramente recuperados, precisamos dos reboques, precisamos dos taiobas e dos bagageiros indos diàriamente até à Rua Muratori e circulando por todo o bairro.  Precisamos dos Limpa-Trilhos e do Bonde-Oficina cuidando permanentemente dos trilhos e da fiação.

Não queremos os franksteins pesados que abram os trilhos e prejudicam os Arcos da Lapa.  Não queremos bonde que circulem somente ao Largo do Guimarães.  Queremos que todos os moradores do Silvestre, pois havia o Bonde Silvestre ao Paula Matos, passando pela Lagoinha, pois havia o Bonde-Lagoinha de 15 em 15 minutos durante todos o dia. Havia o Bonde Dois Irmãos, França e Vista Alegre nos horários de maior fluxo de passageiros.  O bonde não é um sonho, uma abstração.  É uma realidade e, por isso, queremos o bonde.

"QUEREMOS OS BONDES ANTIGOS DE VOLTA COM OS TAIOBAS, REBOQUES E BAGAGEIROS." - Heloisa Pires Ferreira

 

America Latina - Gravura em metal: buril e água tinta- 1983 - 39.4 x 39.6 cm - Foto: Henry Stahl

 

 

Virgílio de Souza entrevista no Jornal Capital Cultural, em agosto de 2005, Heloisa Pires Ferreira:

  "É preciso que as portas estejam abertas, sempre abertas para todas as artes...."

Heloisa Pires Ferreira imaginou uma ideia que lhe pareceu sensacional.  Encontrar um casarão em Santa Teresa que pudesse,  durante o Arte de Portas Abertas, abrigar várias manifestações artísticas. Um lugar onde os moradores pudessem  encontrar ao mesmo tempo poesia,  gravura, teatro, música, bordados, atividades circenses,  exercícios de meditação e atividades infantis..  Descobriu que a Casa Alto Lapa Santa, na Rua Joaquim Murtinho, seria o lugar perfeito. Reuniu amigos e falou da ideia e todos vibraram com a possibilidade. O sonho terminou quando apresentou o projeto aos organizadores do Arte de Portas Abertas. O regulamento do evento só permitia que as portas estivessem abertas para as artes plásticas..  Ela, como artista plástica, podia: as demais atividade,não.

    Decidiu não confrontar com a organização de evento e acatou determinação, expondo na casa os seus trabalhos de gravura, pintura e bordados. Apesar do sucesso individual, lamentou não ter compartilhado o espaço com outras pessoas e outras formas de arte. A artista, que já apresentou seus trabalhos na Espanha, Venezuela e Suécia, evita as críticas, mas confessa que acha os critérios do evento extremamente  complexos.

    __ Acho tudo muito confuso.  Eles usam de argumentos que não entendo e me alegam critérios que funcionam como leis absolutas. Parece que me falta inteligência para entender tudo que  tentam me explicar. Sou uma pessoa simples.  Sempre morei em Santa Teresa e conheço várias pessoas no bairro que trabalham com rabiscos, desenhos, pintura, recitam poesias,  cantam, fazem teatro de bonecos trabalham com circo e, enfim, trazem nas veias o dom de criar, de fazer manifestar a arte  em suas mais diversas formas. Em razão disso, não consigo entender u evento que,  além de se destinar apenas às artes plástica, cria mecanismos para fechar as portas para as outras várias formas de manifestação artísticas do bairro.  Acho lamentável, penso que todas as portas deveriam estar abertas.

     É cuidadosa em suas declarações, pois não quer que sua fala seja entendida como de uma pessoa magoada ou insatisfeita. Ao contrário, faz questão de  parabenizar os criadores e organizadores do evento, mas enfatiza que, se as possibilidades fosse maiores, todos sairiam ganhando.

    __ Não fui eu  quem pensou, criou ou desenvolveu o Arte de Postas Abertas.  Quero deixar claro que acho a ideia genial e merece ser louvada, mas,  co  o decorrer dos anos, a coisa foi se modificando, foi se europeizando.  Não sei se de fato precisamos dessa coisa tão proibitiva, tão intangível.  O critério de se adotar um catálogo é confuso, pois se você não consta naquela relação, parece que você está trabalhando na ilegalidade, na marginalidade. Me sinto com autoridade, para fazer esse comentário, pois nunca adotei uma postura crítica, sempre procurei  participar e colaborar.. Apesar de tudo, não fico indignada comesse contexto; minha inquietação é decorrente do fato de não conseguir desarticular arte do pensamento. Estou cada vez mais convencida de que é através das várias manifestações que nos encontramos e podemos despertar no outro a art do encontro. A gravura de certa forma é uma poesia, a poesia não é uma gravura, mas ao recitar  poesias, você pode levar ao outro uma imagem que pode se transformar  numa gravura, num desenho, numa obra de arte.  A arte pode se apresentar de muitas e várias formas e ser inspiradora. Uma interpretação teatral, um corpo que dança, a letra de uma música, uma máscara circense, pode se transformar num desenho, uma gravura e, por outro lado, uma gravura pode inspirar estas outras manifestações artísticas. Em última análise, penso que a arte sensibiliza e por isso pode despertar, poe inspirar. Não gosto da ideia de se isolar a arte.

    Ela se lembra de que recentemente, quando foi criada a Associação dos Artistas Visuais de Santa Teresa, fez questão de se  associar, participar das reuniões, mas que sempre saía com uma ponta de insatisfação, pois a sensação era a de que meia dúzia de pessoas decidiam todas as coisas.

    __ Me lembro de que ano passado tinha que arrumar uma casa para expor meu trabalho, uma vez que moro num apartamento que não oferece praticidade. Encontrei um belo sobrado, que embora a mim satisfizesse completamente, não foi aprovado pela organização e acabaram por me sugerir um outro local, absolutamente inviável, que não dava para trabalhar Reclamei, enviei e-mails, mas de nada adiantou.

Brasil de Cabeça para Baixo - Gravura em metal: buril e água tinta - 1984 - 0,40 x 0,40 cm - Foto Henri Stahl

Uma artista respeitada e conceituada

A qualidade nos trabalhos que realiza fez com que a artista se tornasse conceituada e muito respeitada. Trabalhou durante muitos anos no Sesc, onde desenvolveu vários projetos, inclusive diversas publicações voltadas para as artes plásticas.  A qualidade de seu trabalho lhe permitiu duas importantes viagens ao exterior.

     A primeira, no final de 1979, quando trabalhava na Oficina de Gravura do Ingá, ganhou uma bolsa para ficar um ano e meio em Portugal, e na ocasião, conheceu Espanha, Itália e França.A segunda, em 1981, quando foi a Venezuela participar de um Festival Internacional de Cultura, e ficou por dois meses. Estas duas viagens, num espaço tão curto de tempo, acabaram por criar uma grande inquietação nos conceitos da artista.

    __ Minha ida à Europa e posteriormente à Venezuela, num encontro com vários artistas das ais diversas áreas, me trouxe uma certa inquietação. A verdade é que muita pessoas, por serem ignorantes ou com o desejo de se mostrar que são importantes, só querem saber e só se importam com o que há de bom na produção artística dos Estados Unidos e da Europa. É como se a nossa cultura fosse uma meleca, um lixo. Acabei por fazer  um trabalho que retratava  a morte da cultura da América Latina. Um trabalho feito com coisas simples como cadeias,  folhas secas,  dinheiro e pequenosmobjetos.

    Passada essa fase que trabalhou a América Latina, a artista fez um trabalho vlorizando os estados brasileiros, suas cores animais e natureza.  Em  junho de 2004 , viajou a Estocolmo, na Suécia, onde pode apresentar suas obras.

    __ O trabalho que levei para a Suécia nunca apresentei no Brasil. Esta exposição aconteceu de maneira curiosa, pois uma pessoa que viu alguns trabalhos de gravura e bordado, ficou absolutamente apaixonada e, depois de alguns contatos, me convidou para expor em Estocolmo. Era uma pessoa rica, influente e acostumada  a visitar grandes exposições.  Foram 40 gravuras e mais alguns panos e tapetes e a exposição foi um sucesso total.  Eles se encantaram  com a diversidade e o equilíbrio das cores e me fizeram muitos elogios.

Outro momento de reconhecimento importante nos trabalhos de Heloisa, foi em 2003, quando a escritora Marilena Chauí, além de fazer uma analise filosófica sobre sua arte, decidiu colocar o O Sol Negro como capa de um de seus livro.

Pedaço de América - Gravura em metal:águas tinta e forte- 1987- 0,30 x 0,30cm  Foto: Henry Stahl

 

 

Viver é uma arte

    Heloisa deveria ter nascido em Santa Teresa, bairro onde passou toda a sua vida. Mas, em razão de problemas de saúde de sua mãe, a família teve que se mudar para Teresópolis, onde nasceu.  Quando ainda era muito pequena, a família voltou a morar em Santa Teresa..  Ela não esconde a paixão pelo bairro:

    __ Amo esse bairro. As pessoas, as casas, os trilhos, os bondes, os costumes. Me identifico como lugar. Essa ligação passa também pelo fato de a casa onde funciona hoje o Centro Cultural Laurinda Santos Lobo ter pertencido ao senador Pires Ferreira, que é da família. O fato do pi ser comunista em pleno governo do Getúlio Vargas, e, em razão disso, ter que arcar com sua opção política, acabou deixando marcas profundas.

    __ Meu pai era uma pessoa curiosa e muito bonita, pois num momento em que as pessoas se preocupavam como crescimento do patrimônio, ele se preocupava em dividir coisas e com o bem estar da humanidade.. Ele era médico e advogado, conhecia as pessoas influentes, e só por isso conseguiu se safar das acusações  que lhe pesavam.  Minha família era burguesa, mas o status nunca fez meu pai deixar meu pai deixar de se preocupar com as questões sociais e políticas.  Era uma pessoa muito ligada ao Morro dos Prazeres, e foi inclusive a pessoa que fez o estatuto do primeiro Sindicato do Morro dos Prazeres. Por sua influência, acabei também por me transformar em uma pessoa preocupada com as questões políticas e sociais. Até 1964, fiz um trabalho social no Morro dos Prazeres.  Nunca fui uma pessoa muito ligada a política,no sentido de fazer política. Acredito que riqueza não pode ser dimensionada pela posse, pela ambição ou bens materiais. Coneço  muitas pessoas ricas maravilhosas e muitas pessoas pobres maravilhosas. Meu pai era um desses ricos que não se conformava com a pobreza e com as injustiças que via a seu redor. Descobri que não quero muitas coisas; apenas o necessário para viver de forma digna.

Santa Teresa   -  Heloisa Pires Ferreira defende um Arte de Postas Abertas que congregue todas as artes.

 

 

Nicaragua  - Gravura em metal: buril, águas tinta e forte - 1987 - 0,40 x 0,40 - foto Henry Stahl

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